Leandro Martins
Psicólogo
A carência de pesquisas
psicológicas sobre experiências ufológicas foi decisiva para que Leonardo
Martins, 35, mestre e doutorando em psicologia, propusesse à Universidade de
São Paulo (USP) dissertação de mestrado em que ouviu o relato de 46 pessoas que
garantem ter tido contado com extraterrestres.
CONTE SOBRE SUA PESQUISA COM CONTATADOS.
Eu trabalho no laboratório de Psicologia Anomalística e Processos
Psicossociais (Inter Psi) do Instituto de Psicologia da Universidade de São
Paulo (USP) e minha dissertação de mestrado foi sobre “Contatos imediatos:
Investigando personalidade, transtornos mentais e atribuição de causalidade em
experiências subjetivas com Óvnis e alienígenas”. Investiguei o perfil
psicológico 46 pessoas que alegaram encontros com pretensos extraterrestres ou ÓVNIs.
Os relatos vão de simples visões de Óvnis a abduções e contatos amistosos.
QUAL FOI SEU OBJETIVO?
Investigar se essas pessoas apresentavam determinadas características
psicológicas que as predisporiam a ter essas experiências sem reconhecer que
elas vieram de “dentro delas”, e não de outro planeta. As características
investigadas incluíram traços de personalidade como ter a mente aberta, tendência
a fantasiar, vontade de aparecer e de ter uma vida estimulante, além da
presença ou não de transtornos mentais que poderiam causar alucinações e
delírios. E, por fim, como essas pessoas, diante de uma experiência subjetiva
inusitada como ver luzes ou seres estranhos, concluem ter testemunhado a
presença de extraterrestres.
POR QUE O INTERESSE EM ESTUDAR A REALIDADE DOS CONTATADOS?
Eu nasci e cresci em Pedro Leopoldo (Grande BH), uma cidade repleta de
histórias extraordinárias desse tipo. Como sempre fui muito curioso e
desconfiado, desejava ardentemente saber se o que aquelas pessoas contavam
tinha mesmo acontecido ou se era “coisa da cabeça delas”. Afinal, havia todo
tipo de histórias: encontros com extraterrestres baixos, altos, com um olho
apenas ou vários, visões de pequenas bolas de luz e de naves enormes, abduções.
Essas histórias e experiências tinham algo de fascinante a ensinar, seja a
respeito de eventuais extraterrestres, seja sobre os confins da mente humana.
Tornei-me psicólogo e constatei uma lacuna de pesquisas psicológicas sobre
experiências ufológicas, especialmente no Brasil. Foi quando decidi unir minha
curiosidade infantil à minha capacitação profissional e colocar a mão na massa.
QUAL FOI O MÉTODO DA PESQUISA?
Testes psicológicos para avaliar a saúde mental e as características de
personalidade dos voluntários, além de entrevistas demoradas sobre seu
histórico de vida, suas experiências com alienígenas, bagagem cultural, crenças
etc.
HÁ ALGUM PADRÃO RECORRENTE EM TODAS ELAS?
As pessoas descrevem quase sempre as mesmas coisas, desde a aparência
humanoide dos ditos alienígenas (embora haja variações significativas de
tamanho, peso, detalhes do corpo) até os formatos das pretensas naves
(normalmente esféricas cilíndricas ou discoides). As sequências de eventos
durante as experiências se repetem, desde o comportamento dos óvnis em voo
(velocidades fantásticas, desaparecimentos no ar, mudanças de forma) até a
conduta dos supostos alienígenas durante as abduções e contatos amistosos (o
tipo de mensagem que é passada, a sequência de exames durante as abduções). Os
voluntários tendem a partilhar características como boa saúde psicológica e
mente mais aberta para novidades e para o questionamento de convenções sociais,
além de um senso estético mais apurado.
QUAL FOI A SUA CONCLUSÃO?
Como foram estudadas variáveis, houve conclusões a respeito de cada uma
delas. Os voluntários não apresentam transtornos mentais em proporção acima da
população em geral. Contudo, a maioria das pessoas que alegaram contatos
próximos tinham certas características que parecem se enquadrar no que a
psicologia e a psiquiatria chamam de “esquizotipia saudável”, tendência a ter
alucinações e ideias não convencionais sem que isso implique nos prejuízos que
caracterizam um transtorno mental. São pessoas saudáveis, que tendem a lidar
bem com experiências altamente estranhas e, ao menos em grande parte,
sugestivamente originadas nelas mesmas.
A PESQUISA PAROU POR AÍ OU VOCÊ VAI SE APROFUNDAR MAIS?
Já estou fazendo novos estudos, utilizando outros métodos para ver se
essas conclusões anteriores estão corretas ou não. Ao mesmo tempo, diferentes
pessoas dão diferentes sentidos para suas experiências, mas sempre a partir da
combinação de influências culturais.
ALGUM DIFERENCIAL QUE CHAMASSE A ATENÇÃO?
Enquanto as pessoas que moram em áreas interioranas tendem a se valer
do folclore e do cristianismo para explicar o que viram (mãe do ouro, algo
enviado por Jesus ou pelo demônio), pessoas de áreas urbanas normalmente se
valem de uma combinação de influências científicas e esotéricas (extraterrestres
espiritualmente evoluídos energias).
COMO VOCÊ DEFINE A CASUÍSTICA UFOLÓGICA?
Longe de a explicação extraterrestre ser algo natural, evidente por si
mesma (como querem os ufólogos), ela é uma construção social e histórica que se
nutre de produtos culturais altamente específicos, da história de vida de cada
testemunha e de experiências subjetivas estranhas.
Créditos: ANA ELIZABETH DINIZ
Fonte: O TEMPO